segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Uma Boneca Boboca Anda Dizendo Coisas Horrorosas

"Meu eu" 
Nesse péssimo dia tudo o que mais almejo é simplesmente relaxar...
Aqui, onde ninguém é de ninguém quando o personagem encarnar.
De dia sou corpo e mente concentrados, à trabalhar.
À noite, uma criança em seu mundo utópico deixando a arte de ser emanar.

Sami Cassiano


Aula de Corpo ( 29 de Fevereiro de 2016)

ESSA PROPRIEDADE ESTÁ CONDENADA

Quando eu cantava, Alva me mandava calar a boca. Mas ela não, ela cantava à bessa, a noite toda. Essas roupas eram dela. Herdei. Tudo de Alva agora é meu. Menos o colar de bolinhas de ouro puro. Ela nunca tirou o colar... E eu herdei também todos os namorados dela. No início eles sumiram todos. Acho que ficaram com medo de ter que pagar alguma despesa, ou coisa assim. Mas, de uns tempos para cá voltaram. Igual andorinhas. Me levaram para sair à noite. Agora eu sou popular, vou a todas as festas da ferroviária. Olha aqui! Como eu danço bem. Eu sei mexer mexer minhas cadeiras. AH! Minha boneca maluca está precisando lavar a cabeça. Eu fico com medo de lavar, com medo que a cabeleira descole, que a cabeça tá meio rachada, você viu. Os miolos dela devem ter saído todos. Ela anda completamente boboca depois que rachou. Anda dizendo e fazendo coisas horrorosa. Preciso colar ela.

Tennesse Williams 

Essa aula teve os mesmos exercícios de alongamentos das anteriores. Mas, dessa vez, o objetivo foi trazer para o texto da peça de Tennesse Williams uma interpretação abstrata, com os movimentos de furar o vento, torcer os pulsos, empurrar e ser empurrado, entre outros. Dois textos foram passados, sendo um masculino e um feminino, ficando a nosso critério escolher qual interpretar. Iniciei a busca pelos movimentos do texto feminino tendo em conta os versos introdutórios de "Meu eu". 

Senti- me por vezes ser a Willie, Amanda e outras tantas garotas que passam até hoje por isso:



Metamorfose
Parte I

Um corpo que, mediante seu próprio olhar 
seja desprovido de malícias ou desejos.
Olhos que precisam de auxílio...
As lentes são a passagem para a vida banal.
Nela, tudo torna- se um emaranhado de gente, 
olhos a observar, coração a palpitar,...
A agonia é tão grande que o ar vem a escapar.
Depois, largo todo o inútil, vou até o centro. 
Eis a passagem entre os mundos paralelos.
Amarrotadas estão as roupas.
Rostos curiosos são apagados na escuridão,
transformam- se em vultos trêmulos e quase imperceptíveis.
Eis que agora somos somente eu e o espelho.

Parte II

Deparei-me com olhos estranhos me encarando pelo reflexo.
Meus dedos tocam suavemente os lábios procurando alguma pureza.
Passo o batom...
Esse lugar agora é tão estranho...
Ouço barulhos.
-Há alguém aí?
Sou atingida repentinamente por um peso concentrado em minhas costas...
Minhas pálpebras revelam aos poucos o desconhecido, corpo bizarro...
Essa pessoa não sou eu.
 Não posso simplesmente ter me tornado isso.
Preciso consertar minha cabeça,
Meu mundo gira e estou envolta em seu peso...
-O que é aquilo?
Realmente,... essa é você...
-Não pode ser eu!
-Que ridícula!
Você não passa de uma boneca boboca que anda dizendo coisas horrorosas...
Esses brincos, esse batom,
um mero disfarce do brinquedo que me tornei.
É muito peso em cima de mim... difícil de aguentar.
Eu posso simplesmente voltar a dormir?
Me acorde quando esse pesadelo acabar.








Essa foi minha concepção relacionada à aula. Uma poesia quase sem fim. Fiquei intensamente conectada com o personagem,e, ainda tento explicar a mim mesma se foi somente pela interpretação ou se foi pelo método da substituição que nitidamente tornava toda essa experiência mais singela e perturbadora ao mesmo tempo. Percebi durante o processo da partitura, que meu corpo parecia dilatar e logo depois ele minimizava seus movimentos, algo me limitava. Foi então que pude entender que consegui ser aquela garota que estava presa num mundo em que não queria estar. Realmente senti- me parte de algo maior.

Att.: Sami Cassiano

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